A pobreza era exigente em Rivotorto. Eram os meses de outono e inverno. Defendiam-se com muita dificuldade das nevadas e dos aguaceiros. Acendiam alguma fogueira para se esquentarem e se secarem. Ás vezes, não tinham nada para comer. Iam pelos campos, alimentando-se de beterrabas e nabos. Não sentiam escrúpulos em lesar a propriedade alheia.
Não era tempo de colheita. Não havia trabalho estável no campo. Alguns dias, quando o tempo permitia, trabalhavam na sementeira dos camponeses. A maior parte dos irmãos prestava serviço nos leprosários. Alguns concertavam calçados ou faziam móveis. Todos tinham seus turnos para ir aos cárceres, aprofundar-se no relacionamento pessoal com Deus.
Este é o noviciado da nova ordem de cavaleiros de Cristo, pensava o Irmão. Com a permissão do Senhor, seja-nos permitido deixar por uns meses as saídas apostólicas, disse aos irmãos. Precisamos crescer na oração, na obediência e principalmente na fraternidade.
Como é o coração do homem! Pensava o Irmão. É capaz de entregar o corpo as chamas, mas, de repente, a saudade pode dobrá-lo como um bambu. Francisco tinha medo; medo de que o tentador se vestisse de saudades. Era a pior tentação, pensava, por ser a mais sutil.
Havia dias em que chovia sem parar. Muitas vezes, ficaram bloqueados pela neve. Não podiam sair do tugúrio. Passavam horas de braços cruzados, em ociosidade forçada, umedecidos até os ossos, com o vento e a chuva penetrando por todos os lados, olhando as águas sujas da enxurrada, sem comida.
Nesses momentos, Francisco sentia que a tentação estava rondando perigosamente os moradores da cabana, dizendo-lhes: Vida absurda, sem sentido. É muito melhor viver lá em cima na cidade, nas casas confortáveis, no calorzinho do fogão, ao lado de uma esposa terna e de filhos carinhosos, alimentando-se com a colheita armazenada graças ao trabalho do ano…
Conhecendo os pontos fracos do ser humano, o Irmão reunia-os todos os dias e lhes repetia estas palavras: Irmãos caríssimos, Deus é nossa esposa. Deus é nosso fogão. Deus é nosso banquete. Deus é nossa festa. Se tivermos Deus na alma, a neve aquecerá. Os invernos transformar-se-ão em primaveras. Infelizes de nós se o Senhor não nos ajudasse. Seriamos arrastados pela torrente da tentação como essas águas de enxurrada, e sucumbiríamos.
Como um hábil treinador, Francisco ensinava-os a boiar nos abismos de Deus. Quando voltavam dessas latitudes, os irmãos eram capazes de enfrentar a geada, a neve e as saudades.
Tirado do livro “O Irmão de Assis”. Capítulo IV, subtítulo: “Tentação das saudades” de Frei Ignacio Larrañaga.








